quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Melhor tripulação que eu já tive*



“Coração fraco nunca ganhou coisa alguma, deixe eles ser bravos, para dançar e cantar.”
- Ditado Africano

Adeus, meus amigos. Mané e Rafaela foram a melhor tripulação que eu já tive. Eles não apenas limpavam, cozinhavam, consertavam e faziam uma excelente vigia (Rafa pode farejar um barco antes mesmo de ele aparecer no horizonte), mas eles também conseguiram mudar a maneira sobre como eu me sinto em relação aos brasileiros, ao amor e à própria vida...

Logo no começo da viagem, Mané nos contou sobre as experiências anteriores deles velejando – como o barco cheirava à gasolina, era molhado, sujo e quase afundou, e como o capitão era maluco, e roubou o dinheiro deles... “mas”, disse ele, “It was really nice” (foi muito legal)...

Esse exemplo mostra a personalidade desse indivíduo singular. Não importa o quão difícil, desconfortável, ou sujo ele esteja, ele consegue sempre enxergar o lado bom. Explorado e mal-pago, desvalorizado, machucado e sangrando, Mané sempre encontrará uma razão para ser feliz...

O eterno otimista… chega a ser até um defeito.

Por pior que estejam as coisas, isso é o melhor que pode ficar. E isso é verdadeiramente o maior defeito do Mané: otimismo demais. Claro, você pode ter que levar algumas coisas que ele diz com um grão de sal: se ele diz que vai ter onda de 6 pés para surfar, é melhor você mesmo checar a previsão, pois pode não estar tudo isso.
Eu aprendi a regular o entusiasmo do Mané através das minhas próprias lentes realistas (pessimistas?).

Mas isso é apenas uma lombada na estrada para uma manifestação positiva. Olhe para a vida deles – eles fizeram acontecer coisas alucinantes, e eles estão apenas no começo. Como o Mané mesmo admite, se não fosse pelo extremo otimismo dele, ele não estaria casado com uma menina tão especial como a Rafaela. Se ele não acreditasse nos seus próprios filmes coloridos, ele seria mediano, igual a todo mundo, trabalhando em algum shopping em algum lugar...

Mandou bem, Mané. Não deixe pessoa alguma lhe dizer que você deveria ser mais realista!

Quanto à Rafaela, se ela tiver algum defeito, eu não sei o que é. Fácil de agradar, bem humorada, charmosa, e corajosa o suficiente para apoiar e acompanhar o Mané em suas aventuras malucas...
Eu só queria que ela tivesse uma irmã.

A evolução de nossa viagem foi muito interessante, “was really nice” (foi muito legal), como diria o Mané. Nós tivemos nossos momentos críticos, especialmente quando o barco estava içado no Panamá, mas nós tivemos nossos momentos mágicos também, e isso é o que velejar REALMENTE significa. Você não pode ter o bom sem o ruim, eles estão conectados. Velejar é o exemplo mais dramático disso: Um dia nós estaremos num sujo Panamá, sujo, chato, e gastando dinheiro como loucos. No dia seguinte estaremos em alguma praia de uma ilha paradisíaca, sozinhos, nadando em água cristalina, e comendo mangas colhidas das árvores...

Obrigado por segurar a onda nas horas ruins até as boas, e por fazer as horas ruins o mais fácil que se pode fazer para dar conta delas...

Também, obrigado por mudar minhas percepções sobre os brasileiros. Vindo do Hawaii, nós somos pré-dispostos a pensar nos brasileiros com barulhentos, pessoas agressivas ao extremo, que vem em matilhas como cães para se adonar das ondas... Bem, eu tenho que admitir que os havaianos são provavelmente tão maus no surf, mas quando você vem de algum lugar, você não olha de verdade para você mesmo bem de perto, olha? Mané e Rafa me ajudaram a evoluir para um novo entendimento da cultura brasileira, e eu acho que eu gostei disso...

Primeiro, Rafaela, quieta, fala mansa, e não-dramática (pelo menos em público), não pisa no calo de ninguém, não força a opinião dela, não tenta ser o centro das atenções. Isso é muito legal e muito refrescante numa menina tão bonita. Seja qual for a cultura... Elas são poucas e difíceis de achar, acredite em mim.

Próximo, Mané. Possivelmente o melhor diplomata na América Latina que alguém poderia pedir para ter... A primeira vez que cruzamos uma fronteira – no México – eu estava com o pé atrás em deixar ele falar com os oficiais. Como Capitão, eu sempre achei melhor dizer pouca coisa, falar o menos possível com eles, e manter a tripulação o mais quieta possível. No entanto, após começar uma conversa sobre futebol, algumas risadas se seguiram, e logo após o official da imigração estava nos fornecendo o e-mail pessoal dele, e nos convidando para jantar na casa dele… A partir daí, eu nomeei o Mané como nosso homem de frente em quantas situações fosse possível. Ele é uma pessoa do povo, e sabe como “engraxar as engrenagens” na medida certa.

Um exemplo perfeito veio no surf... Em um dia chuvoso nós chegamos de bote em um pico altamente protegido por locais no Panama. Os únicos surfistas na água eram os locais, e nós sabíamos que eles não estavam muito felizes em ver dois turistas… Mas… as ondas estavam bombando. O único lugar para deixar nosso bote ali era amarrando ele no barco dos locais... O que nós faríamos…?
“Mané” disse eu, “rema até lá, e vê se nós podemos amarrar nosso bote no barco deles”… Mandando ele para os leões… Então ele foi.

Agora, na maioria das partes do mundo, isso seria uma má idéia. Não apenas nós estávamos craudeando o pico deles e precisando da ajuda deles, mas também, nós éramos brasileiros... Deus nos ajude.
No entanto, Mané facilmente assegurou as boas graças deles, e acenou para mim com um OK para amarrar o bote… Após isso, ele conquistou a coisa mais legal que alguém pode fazer em um pico novo e com forte localismo: ele pegou a melhor onda do dia, e continuou entubando em toda linha dela, com todos os locais olhando e vibrando... Nós estávamos dentro! Mané sozinho nos elevou de repente da condição de cidadãos de segunda classe, para realezas do surf. Grandes sorrisos e risadas por todos os lados...

Daí em diante, eu me dei conta que brasileiros não são tão agressivos, quanto eles são vivos, cheios de vida, querendo viver completamente, conectados com pessoas, e preparados para viver e dar o máximo de suas forças agora, porque o amanhã pode nunca vir...

Agora essa é uma atitude que eu posso acreditar.

Eu apenas espero que um pouco do otimismo deles, da paciência, e da grande sorte tenha vindo para mim também. Esse cínico, cheio de manias, norte-americano. Eu também fiz um trabalho singular em viver minha vida para o momento, mais do que muitos outros, e nisso Mané e eu somos realmente irmãos. Mas eu me dei conta, existe um outro nível.

Mané precisa de absolutamente nada, então ele tem tudo. Rafaela tem tudo, então ela precisa de absolutamente nada.

Que todos possamos chegar lá eventualmente.

Mané e Rafaela, vocês serão meus queridos amigos por toda a vida. Felizes viagens!

-Capitão Cam

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*Traduzido por Gustavo Otto, do original "best crew I ever had", postado aqui no Duplaventura em 21/07/2009.

3 comentários:

NT7 disse...

MANÉÉÉZERA!!!!!!MASSA PRA CARALHO O BLOG E A TRIP!! PRIMEIRA VEZ QUE ACESSEI.
ENCONTREI O RASHID ESSES DIAS NA ÁGUA E FICAMOS CONVERSANDO SOBRE O VOCÊS!
QUERIA MANDAR UMA VIBE BOA PRA VOCES TODOS E QUE NETUNO ESTEJA SEMPRE COM VCS E NO ESPIRITO DO BARCO!
Como parece que o el nino está se consolidando, acho que vai dar um Galáopagos muito bom em Dez e jan. To pensando em ir no natal. Se ainda tiverem pelas áreas e fizer parte da rota, numa dessas nos encontramos lá!!
Forte abraço pro Irmão pra Rafa e pra toda tripulação!

Paulista (mazzer@matrix.com.br)

Anônimo disse...

Fala Paulistaaaa

Valeu a força!!!
Realmente deve estar rolando altas por lá sim, pegamos muito vento contra e ondulação de responsa descendo do Panamá para o Equador.
Neste momento estamos nos preparando para ir para o Atlântico, quem sabe o amigo não troca Galápagos por Noronha???
Abração
Mané

Guno Mendes disse...

Galera, muito legal o blog de vcs! Estava dando aquela "viajada" nos blogs e através do Surf4ever encontrei vcs. Gostei. Esse depoimento do Capitão foi demais. Já adicionei o blog de vcs ao meu. Boa viajem pra vcs...
Abração
Guno