sábado, 11 de abril de 2009

Sortudo do Dia em Rio Nexpa

Fazem 4 dias que chegamos a este vilarejo que vive e respira surf.
O nome da praia deriva do Rio Nexpa, que atualmente, por estarmos no fim da época de seca , tranformou-se numa bela lagoa, boa para banhos (sem crocodilos, que são comuns mais ao sul), e que nos tem presenteado com belos visuais da lua nascendo gigante e avermelhada refletida em suas águas.
Nos anos 60 um grupo de americanos encontrou a onda perfeita que quebra em frente a boca do Rio Nexpa, que formou uma bancada de seixos grandes, em forma de semi círculo, iniciando assim sua fama mundial.
Ao longo desta bancada quebra uma onda perfeita por até 5 sessões diferentes, que fazem a alegria dos surfistas que visitam o Pueblo todos os anos. Uma onda da primeira a última sessão percorre uns 900 metros e leva uns 50 segundos, certamente 50 segundos inesquecíveis em quem teve a sorte de surfar.
Chegamos e tivemos a oportunidade de encontrar o Cheyo, morador da comunidade desde que nasceu, a quase 60 anos, e que atualmente possui algumas cabanas e quartos para alugar, além de um restaurante de frente para o mar.
Alugamos um Bungalow modesto mas muito confortável, com boa privacidade, que foi nossa casa por quase 3 dias.
Ao chegarmos, fomos avisados que não poderíamos ficar todos os dias até domingo, quando iríamos para Manzanillo, mais ao norte, para finalmente embarcar, mas Cheyo nos falou que teria uma barraca para nos emprestar caso fosse necessário
Ontem, assim como no Brasil, o litoral foi invadido por milhares de Mexicanos querendo relaxar em suas belas praias, e Rio Nexpa não fugiu a regra. Centenas de barracas “brotaram” da noite para o dia, cada qual com seu aparelho de som, numa competição informal, todos tentando mostrar que sua música é mais bacana, e náos tendo a certeza que Música de Corno existe no mundo todo.
A barraca acabou sendo necessário. Cheyo já possuía reservas para todos seus quartos, assim como toda a vila, que está com 110% de ocupação e ainda tem gente chegando, assim nos mudamos para a menor barraca da redondeza, mas muito parecida com a que eu passei dois verões na Ponta das Canas.
Montamos nossa nova casinha em baixo do último telhado que sobrou, em frente a lavanderia, e estamos cerados por famílias de mexicanos curtindo o feriadão. A praia está muito parecida com o Farol de Santa Marta nesta mesma época, com pessoas acampando na areia da praia, restaurantes lotados, e uma pequena multidão desfila tranquilamente pela sua “avenida” de 300 metros de extensão, aonde temos a oportunidade de apreciar toda a variedade deste povo.
Durante os últimos dias aproveitamos para descansar bastante, comer bem, relaxar, conhecer pessoas de vários lugares do mundo, e surfar bastante.
A Rafinha já deu seu primeiro banho nas águas do Pacífico, pegou duas ondas, surfou direitinho na prancha nova, na 6´8´´, e trouxe ela inteirinha, ingnorando o fundo de pedras. A Magrinha nestes 9 anos de convívio tem me surpreendido bastante pela atitude e vontade de viver . Ontem não foi diferente, fomos surfar juntos, mas quando chegamos em frente ao canal vi que o mar tinha ganho bastante pressao, já estava com uns dois metros na série na primeira sessão, e no inside, aonde eu imaginava que ela poderia surfar, passavam umas de um metro e meio varrendo os surfistas menos experientes que ficam treinando em uma área mais profunda e mais segura. Eu olhando desconfiado para um quebra coco pior do que o da Praia Mole em dia de ressaca, remexendo pedras de uns 30 centímetros e ela na pilha…. Olha…que onda linda…. Eu vou surfar em Rio Nexpa… e eu ficando com uma dor no coração em cortar as asinhas dela. Eu queria muito ver ela lá surfando comigo nestas ondas de sonho, mas era demais para ela, e a consequência podia ser não muito bacana.
Ao chegarmos no local para entrar, falei para ela que estava meio perigoso e que seria melhor ela esperar para ver se com a maré cheia ficava mais tranquilo para ela surfar, ela ainda olhava na pilha para o mar, mas entendeu. Entrei no mar, surfei um tempo na terceira sessão para ela poder fazer umas filmagens da areia, depois fui lá para fora, peguei umas boas, e saí do mar, para encontrá-la na areia.
Saí e mandei, meio por desencargo, tentando me livrar da culpa de ter frustrado as expectativas dela… E aí Lela, quer tentar pegar umas? Ela nem pensou… já foi pegando a prancha e falando…. É, acho que vou ali tentar sim…. Só deu tempo de pegar a máquina fotográfica e ela já estava chegando na beira da água…. Tive que correr para explicar para ela por onde entrar, mostrar a corrente, mostrar o quebra coco, falar sobre a pouca profundidade e mandar um boa sorte…. Ela ainda olhou para mim com cara de criança que sabe que vai fazer besteira mas mesmo assim vai e faz, e entrou no mar.
A danada conseguiu pegar duas, não foi para o fundo, surfou dois espumeiros, ficou em pé, curtiu, sorriu para a foto e saiu amarradona. Resultado da brincadeira: Eu reavaliando meus conceitos sobre ela e ela tendo que tirar uns 3 ou 4 picos de ouriço dos dedos dos pés. Amanhã ela falou que quer mais!
Eu até agora dei 5 banhos, o mais longo hoje, quase 2 horas, o pior foi logo quando chegamos, que tinha um meio metrão meio estranho, depois só melhorou. Os 3 últimos foram um melhor que o outro, ontem surfei altas, uma da segunda sessão até o inside, uns 700 metros abaixo e a Rafinha se divertiu bastante com minha felicidade ao sair da água.
Hoje acordamos meio tortos por ter que dormir na barraca sem colchão, fui olhar o mar e estava bem desorientado, com ondas desencontradas, desencanei do surf, a Rafinha acordou meio dolorida, e acabamos achando uma boa idéia tentar ir mais ao norte, talvez La Ticla, talvez Pascuales, ambas ondas de qualidade, no meio do nosso caminho a Manzanillo, aonde ficamos sabendo que só teremos que chegar no dia 13.
A idéia era tentar conseguir algum quarto ainda disponível a preço acessível em uma destas duas praias e não ter que dormir mais duas noites na barraca. O problema é que em Rio Nexpa não tem telefone público e os “hotéis” destas praias não trabalham na era da Internet. Conseguimos emprestado o telefone do Cheyo, pegamos o único telefone que achamos em La Ticla, mas fui atendido por uma máquina de Fax. Sem solução, pois não poderíamos pegar todas nossas tralhas, computadores, máquina fotográfica, dinheiro, pranchas, e nossa integridade física e sair andando sem saber aonde iremos dormir. Nunca tinha viajado assim, já tinha estado mais carregado, mas agora tínhamoscom muito valor em jogo…mas tudo se aprende. Achamos melhor não trocar o certo pelo duvidoso.
Acabamos ficando, a Rafinha relaxando na rede, lendo e eu, em uma mesa apoiada na entrada da lavanderia, plugado na tomada da máquina de lavar, tentando editar um filminho para vocês curtirem pelo YouTube, quando o computador trava, perco tudo e levanto indignado. Passa por mim um californiano boa praça, o Bily, vulgo Memo, de 51 anos de idade que ainda pega boas ondas, me olha com aquela cara e ri… eu mando… Computer Sucks!!! Ele ri mais ainda, dou mais uns 5 passos para tirar do campo de visão a barraca gigante em que dormem uns 8 mexicanos, que foi montada bem no meio da nossa vista para o pico e vejo, no meio da tarde, como por milagre, por causa do vento norte que teima em soprar todas as tardes, ONDAS, ONDAS PERFEITAS….sem vento, uma raridade, sem crowd, mais raro ainda nesta época.
Voltei no mesmo pé, mandei para o Bily… Yo man let´s go SURF!!! Ele foi saiu desconfiado da casinha de cachorro que sobrou para ele depois da invasão, e foi checar se era brincadeira minha ou se era alucinação mesmo, voltou mais rápido que eu.
Só deu tempo de pegar a 6´8´´, dar um reforço na parafina, um beijo na Patroa e sair atrás do Bily que já ia pulando de sombra em sombra tentando não tostar os pés na areia preta aquecida por uns 36 graus de sol mexicano.
Fomos para a água, entramos pelo canal, mamata gigantesca, mesmo com as séries maiores passando dos 2 metros. Umas 10 pessoas na água, ninguém no pico mais de fora, aonde as maiores armavam e vinham enrroscando perfeitas até o inside, nem pensamos, fomos direto para lá.
Mesmo com a 6´8´´ foi difícil acompanhar o Californiano, que em uma prancha larga estilo bolachão anos 80, fazia render suas remadas com mais de 50 anos de experiência, vários deles ali naquelas ondas mesmo.
Levamos um bom tempo até chegar no pico, ficamos só os dois, sem vento, água quente, ondas maravilhosas.
Deixei a prioridade para ele que abriu bem a sessão, com uma esquerda média até a terceira sessão. Vim na detrás, um pouco maior, mas não passei a segunda sessão.
Seguimos nos revezando por uma meia hora, até chegar mais um cara, os dois se conheciam, fiquei mais de canto, eles se posicionaram mais para fora, eu ligado, marcando o pico, usando de referência um coqueiro no meio da lagoa e a ponta do morro ao norte, quando vi uma série maior pulsando mais ao sul, a caminho.
Assobiei para os dois que estavam conversando e eles viram a série e começaram a remar para o fundo, chega a primeira onda, grandona, estava mais para eles, o amigo faz que vai mais não vai, Bily continua para o fundo e eu resolvo parar, achei que a onda de trás ia quebrar mais em baixo e esperei para ver. Quando a primeira finalmente passou por mim, vi o Billy, uns 50 metros a minha esquerda, remando para uma parede verde, e a onda passando por ele, vindo em minha direção, só deu tempo de pensar… é minha, virar a prancha, ouvir o Bily mandando GO Buddy!!!, remar forte e botar para baixo. Dropzão, cavada gigante, uma rasgada meio passada dando a volta na esquina e cheguei na segunda sessão, aonde eu sabia que seria mais difícil passar pois normalmente fecha uns 50 metros na sua frente, por isto já vinha embalando desde o drop, acertei a base o melhor que pude, joelho de trás para dentro, o da frente para frente, peito de frente para o bico da prancha, força para frente, e fui acelerando e ela armando, parando, crescendo, eu acelerando e pensando vai dar… vai dar… no canto do olho a onda começando a quebrar, no meio da imagem aquela parede lisa, gigante., verde, duas surfistas tentando entrar no rabo da onda e eu passando a sessão, a espuma bate nas costas, tenta tirar a prancha dos pés, seguro como posso, passo a seção, cavo e subo reto na cara das meninas, rasgadão, ducha nas gringas, mais um cavadão, outra rasgada, entro acelerado na terceira sessão, mando um Uhey, para uns 4 no rabo da onda, ela arma mais uma vez, a prancha vira fácil na onda lisa, mais água para o ar, acelero, mais um viradão depois da esquina, a espuma vem, volto para a parede, ele arma, acho que vai rodar, não roda, mais uma turma na quarta sessão, mais duas manobras, ligadas por uma cavada estilo garçom do Pegorini, mais um passadão e chego no inside com as pernas moles, sorriso na orelha, ainda sai mais uma com força, depois não tenho mais pernas, não consigo segurar o sorriso, gestos ao ar, alegria.
Nos quase 10 minutos que levei para voltar remando contra a corrente, revivi cada momento destes 50 segundos por uma dúzia de vezes, segundos que definitivamente estão marcados na minha memória, vez ou outra comentando com algum surfista que viu de camarote aquela maravilhosa onda com este sortudo do dia, que teve a capacidade de não fazer nenhuma besteira e surfou ela todinha.
A Rafinha se divertiu mais ainda, rindo fascinada quando eu cheguei, mais de uma hora depois de surfar esta onda, mesmo tendo surfado mais duas ondas por toda a extensão, mais empolgado que o Vermute (para quem não o conhece imagina uma criança na manhã de Natal), refazendo na areia os movimentos e sons desta onda inesquecível. Ela viu a onda todinha sentada no restaurante do Cheyo.
Demos mais uma volta no Pueblo para tentar encontrar um quarto ou um colchão para alugar, não conseguimos nem um nem outro. Vamos ter que nos contentar com a capa da prancha, mas já fazem mais de duas horas que a Rafinha está dormindo como um anjo, só acordou uma vez para comentar que estava curtindo a sonzeira eletrônica que vem da beira da praia. E lá em casa reclama da televisão na sala!
Mais um dia maravilhoso chega ao fim.
Amanhã tentaremos mais uma vez contato com La Ticla ou Pascuales, está chegando a hora de deixar estas ondas para os próximos sortudos da vez.

Manuel Alves

Um comentário:

Flavinha disse...

Uau! De arrepiar a descrição da onda, imagina vivênciá-la!!! Sorte que "computer sucks" hein? :)
Que incrível! Mas é isso aí, foi merecida!

Hahaha, adorei a atitude da Rafa (a Lelaaa) :) na hora do vamos ver! Isso aí garota! Hahaha! Minha prima! :D

E a lua hein? Nossa...

Ai, agora a Rafa não vai mais poder reclamar do barulho da TV na sala neh? Sacanagem! :D

Beijão enorme pra vcs,
da fã e torcedora
Flá